‘Somente uma ação entre governo e população pode vencer a dengue’

Subsecretário de Vigilância em Saúde da Secretaria de Saúde alerta sobre a importância da ação dos moradores no combate ao mosquito transmissor.

 

A dengue é considerada uma questão de saúde coletiva. Isso porque a transmissão da doença é ligada aos criadouros do mosquito Aedes aegypti que estão, em sua maioria nas cidades, dentro da área residencial. De acordo com dados da Secretaria de Saúde, mais de 95% do pernilongo rajado são encontrados nas casas.

O principal modo para evitar a proliferação do mosquito e, consequentemente, o aumento do número de casos, é reforçar as ações individuais. Apesar de a Secretaria de Saúde fazer visitas domiciliares, passar com fumacê, aplicar aerossol e pastilhas e testar novas tecnologias e abordagens, para combater o Aedes aegypti efetivamente é necessário que cada morador do DF faça a sua parte, impedindo o nascimento do inseto.

“Basta ter uma lata, um balde ou qualquer coisa que possa fazer uma coleção hídrica, que naturalmente se transforma em uma maternidade. Uma fêmea chega a desovar 350 ovos, com mais de 98% de eclosão. Assim, elas vão se multiplicando numa velocidade muito grande”, explica o subsecretário de Vigilância em Saúde da Secretaria de Saúde, Divino Valero.

Em entrevista à Agência Brasília, o subsecretário falou do importante papel da população no combate à dengue, da situação atual da doença na cidade e das ações feitas pelo governo para prevenir e enfrentar a enfermidade.

Confira, abaixo, os principais trechos da conversa.

Foto: Eline Luz/Agência Brasília

Como está a situação da dengue hoje no DF?

É uma situação de alerta, mas sob controle. No ano passado, estávamos vivenciando um processo pandêmico aflorado de covid. A própria atividade de controle vetorial ficou prejudicada, porque o Ministério da Saúde baixou uma portaria suspendendo a visita domiciliar do agente. Aliado a isso, nós tivemos até o final do ano passado e início deste ano grandes chuvas com densidade pluviométrica acentuada. Outra observação é que a população continua descartando lixo nas ruas e nos quintais. Tudo isso favoreceu a explosão de mosquitos no início de 2022, chegando ao número de 12 mil casos.

Esse número é considerado alto?

Do ponto de vista epidemiológico, não é baixo, mas também não é alto. Nós temos uma população com mais de 2,5 milhões de habitantes fixos no DF e temos ainda outro fator que contribui, que são os moradores provisórios, que vêm das cidades do Entorno e somam aproximadamente 2 milhões. A circulação ampla é um fator, sem contar que no Entorno, quase todas as cidades estão com epidemia de dengue. Por isso, nós fizemos um convênio com a Ride [Região Integrada de Desenvolvimento], e o governador Ibaneis Rocha autorizou o controle vetorial em Valparaíso e no Novo Gama. Se não matar o mosquito nas cidades do lado, ele atravessa e vem transmitir aqui também.

Quais são as regiões administrativas do DF com mais incidência de casos?

As principais regiões com históricos negativos de incidência são Planaltina e São Sebastião. São mais antigas, bem-arborizadas, com muitas casas fechadas, e isso favorece do ponto de vista biológico. Nós chegamos a ter oito cidades no status vermelho, com índice superior a 3% de transmissão. Já conseguimos reduzir o número de casos nessas regiões, com controle vetorial e epidemiológico.

“Se você sentiu uma picada durante o dia dentro de casa, provavelmente é o Aedes aegypti. Então, abra as portas e cortinas; pode usar aromatizador de ar, assim você afugenta os mosquitos”

Como a população pode ajudar no combate ao mosquito?

Somente uma ação conjunta entre governo e população pode vencer uma doença como a dengue, porque mais de 95% dos exemplares d Aedes aegypti se encontram no quintal das pessoas, dentro de casa. Primeiro, evitando deixar tudo que for material descartável em ambientes que possam acumular água. A gente precisa estar vigilante a todas essas possibilidades de criadouros que mantemos sem perceber, como balde, lata, pneu, bacia e qualquer recipiente que tenha ou que possa conter água. Observar também se a caixa d’água está fechada corretamente. Observar ainda dentro de casa. É preciso pegar o hábito de abrir a janela e deixar o sol entrar, porque o mosquito que transmite a dengue fica atrás do fogão, debaixo da mesa, na cozinha e, principalmente, nos quartos atrás das cortinas. Se você sentiu uma picada durante o dia dentro de casa, provavelmente é o Aedes aegypti. Então, abra as portas e cortinas; pode usar aromatizador de ar, assim você afugenta os mosquitos. Outra coisa muito importante é colocar todo o lixo doméstico em saco bem fechado. Dessa forma, vamos vencer, mais uma vez, essa epidemia de dengue aqui no Distrito Federal.

Qual é o risco de deixar qualquer recipiente exposto?

O inseto voa até mil metros por dia. A fêmea tem o hábito intradomiciliar [dentro de casa]; ela pica porque precisa do sangue para maturar os ovos. Já o macho fica do lado de fora, no quintal. Com isso, basta ter uma lata, um balde ou qualquer coisa que possa fazer poça de água, que naturalmente se transforma em uma maternidade. Uma fêmea chega a desovar 350 ovos, com mais de 98% de eclosão. Assim, elas vão se multiplicando em velocidade muito grande.

“O Distrito Federal tem mais de 1 milhão de imóveis, e o problema está dentro da casa das pessoas. O governo faz a sua parte no controle vetorial, mas esperamos que a população faça a sua também, aceitando a visita e fazendo o controle em casa”

Como a Secretaria de Saúde tem agido no combate?

O Governo do Distrito Federal tem uma preocupação ímpar com essa questão da dengue. Nós temos a política de coleta de lixo em todas as regiões administrativas. O governo também montou uma força-tarefa com todos os órgãos do DF, coordenado pela Secretaria de Saúde, que é o Plano de Resposta no Combate à Dengue. Nós contratamos recentemente mais de mil agentes de saúde para as visitas domiciliares. Na medida em que o agente visita a casa e identifica a presença de mosquitos, o governo volta e faz a borrifação intradomiciliar e o tratamento do depósito. Dependendo se naquele bairro houver casos suspeitos ou uma densidade populacional de mosquitos alta, fazemos o fumacê. É importante dizer que o Distrito Federal tem mais de 1 milhão de imóveis, e o problema está dentro da casa das pessoas. O governo faz a sua parte no controle vetorial, mas esperamos que a população faça a sua também, aceitando a visita e fazendo o controle em casa.

E como a pasta também se preparou para os atendimentos de pessoas com dengue?

A nossa rede de assistência está bem-constituída. Nós temos 117 hospitais, postos de saúde, médicos capacitados, estruturas laboratoriais que fazem a identificação, o encaminhamento, o diagnóstico e o acompanhamento desses casos prováveis de dengue. Tanto que o Distrito Federal, com mais de 12 mil casos, teve apenas um óbito, em Sobradinho II. A gente trabalha todos os dias para reduzir e eliminar qualquer tipo de chance de ter casos sustentados de dengue. Portanto, estamos conclamando a população que nos ajude a conter a evolução do mosquito.

“O principal objetivo da secretaria é, a cada ano que passa, aprimorar mais as técnicas, reduzir o número de casos e evitar óbitos”

A Secretaria de Saúde tem testado outras ferramentas, como um novo sistema de fumacê e a aplicação de aerossol dentro de casas e pontos comerciais. Qual é a importância de novas abordagens contra o mosquito?

O inseto se adapta, então é preciso modernizar o controle. Hoje as casas são maiores, a aglomeração das pessoas é mais densa e a tecnologia de transporte faz aumentar o processo de transmissão com mais velocidade. Precisamos inovar, fazendo reconhecimento com bases tecnológicas, colocando drones para identificar espaços abandonados que precisam ser tratados e desenvolver canhões de pulverização com potência maior. A máquina conhecida como fumacê tem um limite, vai no máximo até 30 metros de altura com mais 8 metros de comprimento. No Lago Sul, as casas ficam muito distantes dos muros. A gente passa com o fumacê e não dá o resultado que a gente queria. Então se desenvolvem ferramentas tecnológicas com um alcance maior. O que a gente está fazendo é testar todas as novas tecnologias, em uma parceria entre Secretaria de Saúde, Fiocruz e Ministério da Saúde. Hoje desenvolvemos armadilhas em que o mosquito, ao desovar, se contamina; e, quando voa para desovar em outro depósito, contamina o depósito. No ano passado fizemos um estudo experimental com sequestro de ovos de mosquitos. Conseguimos sequestrar toda a prole e reduzir bastante o número de casos. Isso foi um case de sucesso, e estamos pensando, inclusive, em reproduzir essa modalidade em outras cidades. São estudos em andamento que vão colaborar para o controle desse inseto que está extremamente urbanizado em todo o território nacional, por isso essa dificuldade de eliminar. O principal objetivo da secretaria é, a cada ano que passa, aprimorar mais as técnicas, reduzir o número de casos e evitar óbitos. Essa é a nossa meta, o que a gente corre atrás o tempo todo.

Um outro problema para o trabalho são os imóveis e carros abandonados, além dos entulhos nas ruas. A população tem como acionar o governo nesses casos?

Nossa orientação é denunciar. Pode ligar para a Diretoria de Vigilância Ambiental. Temos programas específicos de coleta de pneus nas ruas e equipes que visitam os locais, mas mesmo os mil agentes de saúde que o governo contratou não são suficientes para atender todos os imóveis do DF. As pessoas podem ligar para o 160 ou para as administrações regionais e para o SLU. Isso é uma ação de cidadania. Não adianta pensar na saúde individual, se não tiver um olhar coletivo. Para o mosquito basta, um depósito para começar o processo de transmissibilidade.

Adriana Izel, da Agência Brasília I Edição: Débora Cronemberger

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *