Por RAQUEL LUIZA,
O que é?
Do inglês Drug Reaction with Eosinophilia and Systemic Symptoms ( DRESS), trata-se de uma reação de hipersensibilidade induzida por droga, potencialmente fatal que inclui: erupção cutânea, anormalidades dermatológicas ( eosinofilia, linfocitose), linfadenopatia e envolvimento orgânico.
A introdução de novas drogas nas últimas décadas levou a uma ampla variedade de reações cutâneas e sistêmicas. Quando a fenitoína foi introduzida nos anos 1940, vários relatos de casos de linfadenopatia se seguiram. A biópsia desses linfonodos revelava um aspecto linfomatoso, sendo que o termo pseudolinfoma induzido por drogas foi cunhado por Satlztein. A fenitoína foi seguida pela introdução de outro anticonvulsivante, a carbamazepina, cujas reações incluíam exantema, febre e linfadenopatia. A essas reações foi dado o nome de síndrome da hipersensibilidade ao anticonvulsivante. Logo depois, várias outras drogas demonstraram manifestações semelhantes, estabelecendo-se o termo de síndrome da hipersensibilidade para descrevê-las. [1]
O termo DRESS foi cunhado em 1996 por Bocquet et al. (Semin Cutan Med Surg 1996; 15:250) [2] para descrever uma síndrome potencialmente fatal ocorrida após exposição a medicamentos e caracterizada por:
- exantema,
- febre,
- alterações em exames laboratoriais (eosinofilia e/ou linfocitose atípica) e
- envolvimento de órgãos internos.
Essa descrição perdura até hoje, apesar de novos estudos terem demonstrado algumas particularidades em relação à doença. Sua incidência é bastante variável. Um estudo prospectivo indiano conduzido por 7 anos demonstrou uma incidência anual de 0,9/100.000 casos na população geral. Outros estudos revelaram uma variação de 1 a 5/10.000 pacientes expostos a anticonvulsivantes, especialmente à carbamazepina e fenitoína, até 1/300 adultos e 1/100 crianças expostos à lamotrigina. [3]
Um padrão muito interessante da síndrome DRESS e que a diferencia de outras farmacodermias é o longo intervalo entre a exposição às drogas e o início do aparecimento do exantema e demais sintomas. Este intervalo costuma ser de cerca de 2–6 semanas, em contraste com 4–9 dias para as erupções morbiliformes e 4–28 dias para síndrome de Stevens-Johnson/necrólise epidérmica tóxica [4]. Alguns artigos citam até mesmo o intervalo de 2–8 semanas entre a exposição e manifestações clínicas [1].
Sendo assim, ao lidarmos com um caso de exantema suspeito de farmacodermia, é importante que se conste no interrogatório não apenas o passado recente do uso de medicamentos, mas também também aqueles que o paciente recebeu até 1 mês e meio a 2 meses antes do aparecimento da erupção cutânea.
Em quem ocorre?
Pacientes em uso das medicações mais comumente envolvidas: antiepilépticos ( eg. carbamazepina, fenitoina e feobarbital) e alopurinol.
DROGAS ASSOCIADAS À SÍNDROME DRESS
A tabela abaixo, mostra as principais drogas relacionadas à síndrome DRESS:
Quais são os sintomas?
Surgimento de erupções cutãneas ( morbiliforme progredindo para eritema confluente e infiltrado, ou eritrodermia esfoliativa) + febre + linfadenopatia + envolvimento orgãnico ( na avaliação laboratorial), 2 a 6 semanas após exposição a droga sabidamente causadora de DRESS.
As manifestações : dermatológicas ( erupção morbiliforme), rede linfática ( linfadenopatia), eosinofilia , sistêmico ( fígado, pulmão, rim).
Como dito, geralmente a erupção cutânea se inicia após 2–6 (até 2–8) semanas do contato com a droga indutora, ainda que não se possa excluir DRESS se os sintomas se iniciarem antes desse período.
O exantema começa como morbiliforme, que rapidamente progride para um eritema infiltrativo, difuso e confluente, com acentuação folicular. A face e a parte superior do tronco são os locais inicialmente acometidos. Sugere-se DRESS quando a erupção atinge mais de 50% da área de superfície corporal e/ou inclui duas ou mais dessas características:
- edema facial,
- lesões infiltrativas,
- descamação e
- púrpura [4].
Pode haver, numa pequena porção dos casos, aparecimento de bolhas, vesículas, pústulas ou até mesmo dermatite esfoliativa.
O edema facial surge em metade dos casos e caracteristicamente é simétrico, persistente e associado ao eritema. Pode ocorrer acometimento de membranas mucosas em metade dos casos, mais frequentemente na boca ou na faringe (e raramente em mais de um sítio), caracterizado por inflamação e dor locais, com ou sem ulceração [7]. Sendo assim, cuidado deve ser tomado para não se confundir esses quadros com escarlatina.
Sintomas sistêmicos se caracterizam por febre (38 a 40 ºC), queda do estado geral, linfadenopatia e sintomas relacionados ao envolvimento visceral.
O envolvimento de órgãos internos acontece em cerca de 90% dos pacientes, sendo o mais comum o fígado (60–80% dos casos, com elevação das transaminases e da fosfatase alcalina [FA], sinais de disfunção hepática [aumento de bilirrubinas e alteração do coagulograma] e até mesmo com sinais de encefalopatia pela hepatite aguda, com alteração do nível de consciência). Hepatites graves são as principais causas das mortes relacionadas à síndrome DRESS. Outros órgãos frequentemente acometidos são os rins (10–30% dos casos, com nefrite intersticial aguda, aumento dos níveis de ureia e creatinina e proteinúria discreta, além de eosinofilia em análise de sedimento urinário) e os pulmões (5–25% dos casos, com sintomas inespecíficos como tosse e taquidispneia). [4] Virtualmente, todos os órgãos do corpo podem ser acometidos.
Como é realizado o diagnóstico?
Suspeitar clinicamente. Investiação laboratorial para excluir outras condições semelhantes e avaliar extensão e gravidade envolvimento visceral:
Hemograma + esfregaõ sanguíneo: eosinofilia periférica ( >700uL) e /ou linfocitose ( > 4500 uL) e/ou linfócitos atípicos;
Avaliação hepática:FA > 1,5x limite superior, em pelo menos duas medições. ALT > 2x limite superior, em pelo menos duas medições;
Sorologia de hepatites virais negativas ( excluir hepatites se alterações hepáticas);
Aumento moderado de creatinina, proteinúria leve, e/ou sedimento urinário com eosinofilúria;
Biópsia de pele: método pouco utilizado, com achados inespecíficos. Em alguns contextos, pode contribuir para a suspeita diagnóstica.
Como é o tratamento?
Identificação e suspensão do fármaco + corticoide tópico. Se nefrite ou pneumonia intersticial, corticoide sistêmico ( Prednisona 0,5 -2 mg/ kg/dia). Acometimento hepático grave pode exigir transplante hepático.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
- Choudhary S, McLeod M, Torchia D et al. Drug Reaction with Eosinophilia and Systemic Symptoms (DRESS) Syndrome. J Clin Aesthet Dermatol. 2013 Jun; 6(6): 31–37
- Bocquet H, Bagot M, Roujeau JC. Drug-induced pseudolymphoma and drug hypersensitivity syndrome (Drug Rash with Eosinophilia and Systemic Symptoms: DRESS). Semin Cutan Med Surg. 1996 Dec;15(4):250-7
- Cacoub P, Musette P, Descamps V, et al. The DRESS syndrome: a literature review. Am J Med 2011 Jul; 124:588
- UpToDate: Drug reaction with eosinophilia and systemic symptoms (DRESS) — acesso em setembro/2017
- Hemocentro RP, O que são células T regulatórias?. Disponível em: http://ead.hemocentro.fmrp.usp.br/joomla/index.php/noticias/adotepauta/667-o-que-sao-celulas-t-regulatorias
- New Zealand Medicines and Medical Devices Safety Authority. Publications. DRESS syndrome: remember to look under the skin. Prescriber Update 32(2): 12-13. June 2011