Por Raquel Luiza,
Resumo
A granulomatose de Wegener (GW) é considerada vasculite sistêmica granulomatosa necrotizante de vasos de pequeno e médio calibres, idiopática, com envolvimento multissêmico, geralmente afetando trato respiratório e rins.
Pode ser dividida em duas formas: clássica e limitada. Nesta última inexiste comprometimento renal. Os pacientes habitualmente apresentam febre,artralgias, nódulos esparsos na pele, ulceração mucosa e tosse improdutiva.Os sintomas pulmonares podem variar desde sinusites até hemorragia pulmonar difusa e insuficiência respiratória. O envolvimento renal é comumente expresso pela insuficiência renal crônica ( IRC).
Dados laboratoriais inespecíficos refletem alterações urinárias e anemia,pela IRC, e atividade inflamatória aguda. Em contraposição, considera-se o ANCA o mais específico no diagnóstico.
A radiografia de tórax pode mostrar infiltrados, nódulos ou cavitações pulmonares. Nas biópsias observam-se vasculite neutrofílica ou granulomatosa necrotizante, com células gigantes nos granulomas epitelióides. O tratamento com corticosteróides e imunossupressores melhorou significativamente o prognóstico da doença. Uma revisão da clínica, da histopatologia e dos achados laboratoriais da GW é apresentada, e particularmente, as manifestações cutâneas, pulmonares e renais são discutidas.
A prevalência gira em torno de 5 casos por milhão de habitantes, com incidência anual de 4,7 por milhão de habitantes. Não há diferenças entre os sexos, é mais frequente na raça branca, e o pico máximo de incidência é entre 40-60 anos.
Sintomas
Na GW, a tríade clássica consiste em envolvimento das vias aéreas, glomerulonefrite e vasculite; no entanto, não está presente em todos os pacientes. Os sintomas iniciais mais frequentes na esfera otorrinolaringológica são rinorréia purulenta ou sanguinolenta, ulcerações da mucosa nasal e oral e sinusite ou otite recorrente. Pode progredir, causando destruição do septo nasal e das paredes do seio.
A granulomatose de Wegener costuma iniciar-se de forma indolente, com sintomas leves e inespecíficos como cansaço, perda do apetite, febre baixa e desânimo. Os primeiros sintomas específicos costumam ocorrer nas vias aéreas superiores com rinite e sinusite. O quadro pode lembrar o de uma gripe, porém, com a duração dos sintomas muito maior.
Depois de começar de modo brando, a vasculite apresenta um rápido agravamento dos sintomas. A sinusite piora e não responde a nenhum tratamento convencional. A secreção nasal pode se tornar sanguinolenta e deformidades e ulcerações dentro e fora da cavidade nasal podem surgir.
A progressão para a órbita pode levar à proptose ocular.
- O envolvimento pulmonar aparece em proporção semelhante à otorrinolaringologia no curso da doença.
O acometimento do pulmão na granulomatose com poliangiite é típico. Até 1/3 dos pacientes que cursam com lesão pulmonar apresentam um quadro brando. Os outros 2/3, porém, sofrem com uma doença mais grave.
Os principais sintomas da vasculite pulmonar pelo Wegener são a tosse, a falta de ar e a expectoração com raias de sangue. Em 5% a 10% dos casos, a vasculite das vias respiratórias é muito grave e leva a uma grande hemorragia pulmonar com uma maciça expectoração de sangue. Se não for tratada, a lesão pulmonar pode ser fatal.
- No nível renal, microhematúria, cilindros de hemácias, proteinúria e insuficiência renal podem ser observadas em diferentes graus. Ao nível microscópico, o mais frequente é encontrar uma glomerulonefrite focal e segmentar.
Os rins são outros órgãos frequentemente acometidos pela granulomatose de Wegener. A lesão típica é uma glomerulonefrite necrotizante.
O quadro clínico da glomerulonefrite pelo Wegener se caracteriza por uma insuficiência renal aguda, manifestada por uma rápida e súbita elevação da creatinina associado a hipertensão arterial e hematúria (sangue na urina).
A vasculite renal leva a destruição do tecido funcionante dos rins, e se não tratada a tempo, torna o paciente dependente de hemodiálise.
Não é incomum o acometimento simultâneo dos rins e dos pulmões, chamada de síndrome pulmão-rim. Toda vez que um paciente se apresenta com expectoração sanguinolenta associado a hematúria ou elevação súbita da creatinina, a granulomatose de Wegener é um dos principais diagnósticos diferenciais.
Outras manifestações incluem:
Envolvimento cutâneo (nódulos subcutâneos, pápulas ou púrpura palpável);
Olhos (conjuntivite, esclerite, episclerite);
Sistema nervoso (mononeurite múltipla, vasculite do Sistema Nervoso Central – SNC);
Digestivo (vasculite intestinal, que ocorre frequentemente com perfuração intestinal) e outros (pericardite, orquite).
Qualquer uma dessas manifestações pode ser acompanhada por sintomas sistêmicos inespecíficos, como fadiga, fadiga, febre ou perda de peso.
Diagnóstico
Através das análises de sangue é possível detectar um auto-anticorpo típico do Wegener, chamado anticorpo anti-citoplasma de neutrófilo, ou simplesmente ANCA. A presença deste auto-anticorpo é importante para o diagnóstico uma vez que o mesmo está presente em até 90% dos casos, porém, sozinho, não é suficiente.
Os anticorpos anticitoplasma de neutrófilos c-ANCA são detectados em 80%-90% dos pacientes na GW com envolvimento sistêmico e em 40%-70% dos casos com envolvimento local.
Os anticorpos antinucleares são geralmente negativos.
Para se fechar o diagnóstico do Wegener é preciso uma biópsia, remoção de um pedaço do tecido afetado para avaliação microscópica. Biopsias da nasofaringe ou da pele são mais fáceis de ser realizadas, mas nem sempre há lesão visível para se obter amostras. Muitas vezes é preciso lançar mão de um procedimento mais invasivo para realização das biópsias de pulmão ou dos rins .
É estabelecido na presença de pelo menos 2 destes critérios diagnósticos:
1. Inflamação oral ou nasal: úlceras da mucosa oral ou secreção nasal purulenta ou sanguinolenta.
2. Alteração na radiografia de tórax: nódulos cavitados ou não, ou infiltrados não migratórios.
3. Alteração no sedimento urinário: Microhematúria (maior que 5 hemácias/campo) ou cilindros de hemácias.
4.Biopsa: inflamação granulomatosa na parede vascular, perivascular ou extravascular.
Tratamento
Como se trata de uma doença de origem imune e potencialmente muito grave, o tratamento é feito à base de imunossupressores fortes. Não existe cura para a granulomatose com poliangiite, porém, a história natural da doença mudou muito nos últimos 20-30 anos.
As principais drogas usadas são os corticoides em doses elevadas e a ciclofosfamida. Outras drogas que também podem ser usadas são a azatioprina, leflunomida, metotrexate ou rituximab.
O uso do antibiótico Bactrim, por motivos ainda não bem esclarecidos, também parece ajudar no controle da doença, além de prevenir infecções oportunistas pela imunossupressão.
Nos casos graves com rápida perda da função renal e hemorragia pulmonar, indica-se a realização da plasmaférese para remoção imediata do excesso de auto-anticorpos circulantes.
Com as atuais drogas imunossupressoras, cerca de 75% dos pacientes conseguem atingir remissão completa da doença. Destes, 30% apresentam recaídas ao longo do tempo, necessitando retorno da imunossupressão. Se antigamente mais de 90% dos pacientes faleciam no primeiro ano, hoje em dia, a mortalidade em 5 anos é menor que 20%.
Referências
- Revised 2017 international consensus on testing of ANCAs in granulomatosis with polyangiitis and microscopic polyangiitis – Nature Reviews Rheumatology.
- Granulomatosis with polyangiitis and microscopic polyangiitis: Initial immunosuppressive therapy – UpToDate.
- Granulomatosis with Polyangiitis (Wegener’s) – American College of Rheumatology.